quinta-feira, abril 27, 2006

Mark Romanek



"Something I learned later in my career is that when things seem like they're going wrong , They may actually be going right" (Mark Romanek)

quarta-feira, abril 19, 2006

RUPTURA EM 3 ACORDES

MOVIMENTO QUE NOS ANOS 70 DERRUBOU TABUS CULTURAIS, LINGÜÍSTICOS E DE COMPORTAMENTO SOBREVIVEU COMO IDÉIA LIBERTÁRIA, MAS SEUS ÍCONES FORAM ABSORVIDOS PELO ESTABLISHMENT

POR ENRICO FRANCESCHINI

Londres. "Minha loja se chama Championship Vynil. Vendo discos de música punk." E não só de punk: também de blues, soul, R&B, umas coisinhas das Antilhas, pop dos anos 60, "tudo para o exigente colecionador de discos", como diz a frase na vitrine. "Alta Fidelidade" (Rocco), o romance que deu fama a Nick Hornby, 48, começa praticamente assim, se excluirmos o prólogo com o ranking dos "fracassos" sentimentais do protagonista.
Uma história fundamentalmente autobiográfica, tanto do ponto de vista amoroso quanto, talvez mais ainda, no aspecto musical. Porque o escritor gostava muito de punk. E, em certo sentido, continua gostando, como nos diz Nick Hornby 30 anos depois.

Pergunta - Qual a sua lembrança do nascimento desse fenômeno musical, social, cultural, enfim, do surgimento de uma enésima "moda" inglesa que conquistaria o mundo?

Nick Hornby - O ano de 1976 foi quando comecei a cursar a universidade, e a Universidade de Cambridge era talvez o lugar menos apropriado para entrar em contato com o punk. Qual o motivo que tínhamos para estar com raiva, ali, em Cambridge? Por outro lado, eu estava com 19 anos de idade, não tinha nada para fazer durante o dia, e o outono de 1976 parecia tremendamente excitante.
Comprei todos os discos de punk que me caíram nas mãos, mas não é que houvesse muitos à venda nos primeiros dois ou três meses.
Na época deviam existir uns 40 ou 50 punks em toda a Inglaterra, mas era absolutamente claro que alguma coisa estava acontecendo, e você tinha que escolher de que lado ficar.
Era possível optar pela velha guarda, pelas bandas de rock grandes, chatas e repetitivas como os Rolling Stones, o Led Zeppelin ou Rod Stewart; ou então escolher esses caras que, para ser sincero, não sabiam tocar, mas tinham uma extraordinária energia e atitude.
Pelos meus adjetivos, você pode deduzir de que lado eu fiquei.


Pergunta - O que o punk tinha de tão extraordinário?

Hornby - O grande lance é que, nos dez anos precedentes, o rock tinha começado a ser visto seriamente, de uma maneira muito pomposa, e o punk destruía essa seriedade pomposa. Por exemplo, havia um terrível crítico musical no "Sunday Times" que adorava o Yes e o Pink Floyd, defendendo que aquilo é que era música autêntica, séria e complexa como a música erudita. E, a meu ver, pessoas como ele estavam acabando com o rock, porque queriam vendê-lo a meus pais e a todo tipo de gente que não seria capaz de entender ou apreciar aquilo.
A essa altura, de repente, surgem uns caras que só conhecem três acordes, sujeitos crus e simples ao extremo, e isso era para mim, e continua sendo, o ponto central. Eu não estava à procura de uma nova música erudita nem buscava complexidade ou seriedade. Eu queria alegria, velocidade e o volume no máximo. Com os olhos de hoje, vejo que a música punk me fez pensar muito, sobre um monte de coisas. Foi uma fantástica educação cultural.


Pergunta - Como era Londres naqueles anos? Você sente saudade de alguma coisa?

Hornby - A revista musical mais recente que tenho no banheiro, datada de fevereiro de 2006, está cheia de propagandas para shows de Sparks, Joan Baez, Judy Collins, Bon Jovi, Bonnie Raitt, Eagles e Santana, só para citar alguns. Todos eles poderiam ter tocado na Londres de 1975, e alguns deles já eram veteranos naquela época. Ao que parece, estamos de novo enterrados na areia.
A saudade que sinto daquela época está ligada à explosão fulminante de coisas novas -novos hábitos, novos escritores, novas idéias e, naturalmente, novos grupos musicais. Clash, Sex Pistols, Jam, Elvis Costello, Ian Dury, Buzzcocks e muitos outros se tornaram famosos em menos de um ano e mantiveram a fama pelos 30 anos seguintes.
Não é um exagero dizer que, naqueles dias, alguma coisa nova, boa, importante e divertida acontecia praticamente toda semana. E é disso que eu tenho saudades.


Pergunta - Em sua opinião, quais foram os melhores momentos da era punk?

Hornby - Em 1977, a colisão do punk com o Jubileu de Prata da rainha [Elizabeth 2ª] foi um momento bem interessante. Em junho, a BBC maquiou as vendas de "God Save the Queen" [Deus Proteja a Rainha], dos Sex Pistols, para que a música não ficasse no topo da parada durante as comemorações do Jubileu.
Outros grandes momentos: o primeiro álbum do Clash, se bem que meu álbum preferido do grupo seja "London Calling" [1979], lançado na verdade quando os dias gloriosos do punk já haviam passado. E os concertos "Rock against Racism" [Rock contra o Racismo]. Mas não se tratava de muitos momentos grandes e isolados. Tudo foi um único, longo e forte momento.


Pergunta - E os piores momentos?

Hornby - A morte de Sid [Vicious, baixista do Sex Pistols] e Nancy [Spungen, namorada de Vicious] foi um caso sórdido e deprimente. Vicious sempre parecera um tipo brincalhão, uma paródia irônica da percepção que o establishment tinha do punk -e de repente nos demos conta de que tudo aquilo era sério, tão estúpido e confuso quanto parecia. Outro momento realmente baixo foi o do flerte com as suásticas, muito embaraçoso para os que estavam sempre prontos a defender tudo o que fosse ligado ao punk.


Pergunta - Mas você ainda gosta da música punk?

Hornby - Danny Baker, que fundou o primeiro jornal punk e depois se tornou um célebre DJ, disse recentemente: "A era punk foi a fase mais bela de minha vida, e eu me sinto agradecido por cada momento que vivi naqueles dias. Mas hoje eu poderia muito bem passar sem nunca mais ouvir uma nota punk, pois já não me importa". Também penso mais ou menos assim.
Às vezes ouço "London Calling", mas não acredito que, no geral, a música punk tenha resistido à prova do tempo. Exceto a versão americana do punk, que ainda soa fantástica aos meus ouvidos -Patti Smith, Television, Ramones. Talvez porque estivesse enraizada em todo tipo de coisas; já na Inglaterra, o ponto fundamental do punk era o fato de que 1976 era o ano zero.


Pergunta - Mas ainda se vê o visual punk por aí. Em Londres, é so ir ao bairro de Camden para ter a impressão de que se está no fim dos anos 70.

Hornby - Mas isso é uma moda para turistas, nada mais. Um punhado de jovens europeus mascarados, com cabelos coloridos e argolinhas no nariz. Não significa nada.


Pergunta - Mas então o que significa o fenômeno punk 30 anos depois?

Hornby -Acho que ele mudou algumas coisas para sempre. Em primeiro lugar, a Inglaterra ficou menos afetada, menos sensível ao que foge à regra. Quando os Sex Pistols falaram obscenidades na TV em 1976, aquilo foi um escândalo nacional de primeira página, e é difícil imaginar algo parecido hoje.
Também acho que, desde então, continua viva a idéia de que qualquer um pode fundar uma banda ou um jornal ou publicar um livro ou gravar um álbum.
De certo modo, as novas tecnologias nos ajudaram a preservar o espírito punk, porque agora é muito mais fácil fazer qualquer coisa. Mas, naqueles anos, minha geração aprendeu com o punk uma coisa fundamental: que era possível fazer mais do que nunca imagináramos.


Pergunta - Umberto Eco diz no "Nome da Rosa" (Nova Fronteira) que, no final, quando uma coisa desaparece, dela só fica o nome. E de fato a palavra punk sobreviveu, ainda que o sentido varie no tempo (ao pé da letra, quer dizer "pessoa insignificante", mas o significado mais comum na gíria inglesa é o de "delinqüente"). O que você sente, hoje, quando a ouve?

Hornby - Concordo com que seja usada para qualquer coisa, menos para a música. Gostaria de ler um romance punk, assistir a um filme punk, ver algo punk no teatro. Mas música punk significa sempre aqueles mesmos três acordes, aquelas calças sadomasoquistas de couro preto, aquelas cusparadas. Deixa pra lá, tudo isso já terminou.


Concordo com as palavras do Nick...

segunda-feira, abril 17, 2006

Não leve o rock tão a sério

Essa história começou na virada dos anos 70/80, com a sempre exagerada imprensa musical inglesa, e não demorou a se refletir no Brasil.
É o vício de levar o rock a sério. De apresentar gente como Ian Curtis (do Joy Division), ou Morrissey (dos Smiths) como salvadores e porta-vozes de uma geração. De chamar a vocalista Elizabeth Fraser (dos Cocteau Twins) de "a voz de Deus". De passar uma vida inteira discutindo mensagens subliminares em letras do Led Zeppelin. De venerar guitarristas, escarafunchar versos de meras canções populares em busca de um significado maior.
Minha geração de jornalistas musicais tem responsabilidade sobre isso. Com avidez pelo novo, mas muito menos bagagem intelectual e musical do que nossos equivalentes gringos, adotamos uma versão rasa do estilo da imprensa londrina.
A crítica ficou reduzida a um jogo de palavras. À busca de algo que soe bem e falseie erudição -retórica vazia. Desculpe a pieguice, mas sinto culpa ao ver algum jornalista mais jovem formular teorias sobre uma nova banda de moleques ingleses que nunca devem ter lido mais do que cinco livros e cuja coleção de discos resume-se aos três dos Strokes e algo dos Ramones.
Agora, por exemplo, há o deslumbramento com os Arctic Monkeys, da Inglaterra. "As letras citam Shakespeare", comenta-se no mundo todo. Ora, na Inglaterra, aprende-se Shakespeare desde o ensino fundamental... Inegável que as letras dos Arctic Monkeys ficam muito acima da médica roqueira, mas daí a elevá-las ao status de grande poesia...
Letra de música -rock, samba ou o que for- não é literatura. É claro que existe Morrissey, culto, com suas letras recheadas de citações literárias. É claro que existe Chico Buarque, com a sofisticação de suas métricas incomuns e aliterações. Mas são só compositores populares. Não vieram salvar ninguém.

("Álvaro Pereira Júnior", folha de São Paulo)

Arquivo do blog